quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

DICA DE LEITURA 9


Olá, ilhas de angústia em mar de solidão! ¿Como vão indo? Pois eu voltei com mais uma dica de leitura. Antes, uma pequena introdução. Desde a década retrasada, ao menos neste "país" (aspas são opção), inovar tornou-se um mantra tântrico, uma obsessão fetichista, um atavismo hereditário. É que a abertura do mercado brasileiro às exportações (1990) expôs os produtores nacionais à concorrência das tecnologias estrangeiras e, tal como se cria, essa exposição forçaria os empresários brasileiros a buscarem parcerias com os cientistas, visando o desenvolvimento de inovações tecnológicas que lhes permitissem competir com os produtos importados. Era o que se cria na época. O brasileiro é mesmo um homem de fé!

Desde então, nos evangelhos acadêmicos e nos relatórios das políticas-públicas, a palavra inovação tornou-se um conceito-ônibus, dentro do qual é sinal de educação colocar todas as esperanças para os mais inusitados problemas: a desigualdade, a dependência, a super-inflação, a calvície, a pulga da sogra, a angústia existèncial, etc. Florestas inteiras foram oferecidas-em-sacrifício no altar do papelório científico pùblicado para endossar as teses da inovação como panacéia universal. Mas... ¿e se eu lhes dissesse que a ânsia pela inovação a todo-custo pode fazer com que grandes empresas quebrem e sejam ultrapassadas por empreendedores inicialmente insignificantes? Parece um paradoxo, né?

Pois é mais-ou-menos esta a tese defendida pelo livro mundialmente famosíssimo "O dilema da inovação", de Clayton Christensen. Tentarei explicar sua tese. Suponhamos então que você precise comprar uma impressora doméstica para imprimir aqueles trabalhos de faculdade que você plagia do meu blog. Você vai à loja e encontra três opções: 1) uma impressora vagabunda a jato-de-tinta por R$ 155,00; 2) uma impressora multifuncional a jato-de-tinta por R$ 240,00 e 3) uma impressora multifuncional a laser, cheia de badulaques & paranauês, por R$ 1.070,00. Pergunto-lhe: ¿qual delas é a melhor? Você responderá: a terceira impressora, òbviamente. ¿Mas é essa a impressora que você levaria para casa?

Hum... Pergunta marota, né? Embora você admita que a terceira impressora seja a top do mercado, você sabe que, para o uso que você fará dela, todos aqueles recursos oferecidos serão um tremendo dum desperdício. Talvez você também ache que a primeira impressora seja tosca demais para seus malignos propósitos estudantis. Agora imagine milhares de pessoas tomando decisões iguais às suas. Conclusão: pelo visto, o fàbricante da terceira impressora gastou milhões de dólares para desenvolver um trambolho faraônico que ninguém, além de milionários excêntricos, irá comprar. Moral da estória: ele inovou demais; pressionado pela concorrência, ele ultrapassou a margem de inovação que os clientes podiam absorver.

Há, portanto, uma área ou margem no mercado, representada pela faixa verde-escuro da figura abaixo, onde se encontra o grosso dos clientes: é o segmento mais lucrativo e nùmeroso. Essa margem está limitada por duas linhas: 1 e 2. Estas, por sua vez, representam, respectivamente, o grau máximo de inovação admitida pelos clientes ("acima desse nível, sua tecnologia é excessiva para mim") e o grau mínimo de inovação admitida pelos clientes ("abaixo desse nível, sua tecnologia é insuficiente para mim"). O Santo Graal de toda estratégia de inovação é entrar nesse nicho verde-escuro e não sair mais dele, só acompanhando seus movimentos. O problema, como diria Garrincha, é combinar isso com os "russos".

A tese da inovação disruptiva explica então alguns fenômenos interessantes & verdadeiros: 1) Os empresários encontram-se espremidos por solicitações contraditórias: dum lado, a concorrência os pressiona a inovar cada vez mais; do outro lado, porém, os clientes passam a dar sinais de que não companharão o avanço da tecnologia para além dum certo limite. 2) A tara por inovar pode arrastar as grandes empresas (a linha A) para uma espécie de acostamento VIP do mercado, onde se encontram consumidores de elevado poder aquisitivo, mas cujo volume de compras não geraria um fluxo-de-caixa robusto e sustável. É aí que as grandes empresas sofrem o ataque das inovações disruptivas vindas de baixo (linha B). 

Uma inovação disruptiva caracteriza-se por oferecer, inicialmente, soluções mais simples & baratas que suas congêneres. Sendo mais compatíveis e acessíveis aos consumidores situados na base da cadeia-de-valor, elas têm a vantagem adicional de envolverem menos custos e menor volume de investimento para sua produção. A desvantagem, entretanto, é seu pior desempenho e qualidade (para o consumidor) e seu menor retorno financeiro (para o empresário). Devido a essas características, as inovações disruptivas são adequadas para as startups, mas são vistas como pouco atraentes para as grandes empresas, que preferem se exibir no mercado oferecendo produtos de alta performance (e maiores margens de lucro).

É aí que mora o perigo, pois, mineiramente & lentamente, as inovações disruptivas vão amadurecendo por meio dum aprendizado contínuo com sua clientela; vão ganhando músculos e adquirindo condições de roubar fatias do mercado das companhias consolidadas. É o que está acontecendo hoje com as tecnologias de pagamento eletrônico e com muitos aplicativos para telefonia móvel. Inovações disruptivas não são apenas radicais; elas também são escalares e têm condições de fazer aquilo que Schumpeter chamava de destruição criativa. Aliás, esse livro de Christensen é uma das mais radicais e criativas contribuições à teoria das inovações tecnológicas. Eu recomendo vivamente sua leitura!

Diagrama da inovação disruptiva conforme as pesquisas de Christensen.


CHRISTENSEN, Clayton. "O dilema da inovação". São Paulo: Makron Books, 2012. 320 páginas. R$ 89,00.

DEPOIMENTOS:

"O novelo da ovelha é novato. O ovo é nevoado de navalhas e ovários. Que inovação há nos ovos do novilho! Neva no nariz da noiva. Uma ova! Lacra treze! Lacra treze!" 

August Fields, revolucionário de churrascaria e poeta da corte.


"Eu só conheço três bons negócios que podemos fazer com inovações: roubar, imitar e chupar. O terceiro deles tem até desdobramentos pornográficos que vêm de brinde."

Juanito Cabrón Cabrito, milongueiro, intelectual e estereótipo. 

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